domingo, 22 de maio de 2011

VARIG - O OCASO DE UMA ESTRELA

Não vou discutir quem surgiu primeiro se a Varig ou a Cruzeiro do Sul, ambas querendo o mérito nos anos sessenta, o que sei é que ao me candidatar para ser um comissário de bordo da Varig em 1965, suas instalações no Rio de Janeiro ainda eram precárias e a seleção feita dentro de um tosco hangar no aeroporto Santos Dumont. Porém, ao retornar na tentativa e conseguir aprovação no ano de 1970, o que encontrei foi uma Varig sólida, capaz e inteligente, dona de grande know how de aviação comercial e majoritária no país.

Eu e a escritora Claudia Vasconcelos pertencemos à Varig, atuando no mesmo cargo por mais de vinte e cinco anos como comissários de bordo e hoje ambos aposentados somos escritores, ela diga-se, merecidamente reconhecida através do livro Estrela Brasileira, com lançamento para o próximo dia 27 de maio, as dezenove horas na Livraria Travessa Shopping Leblon, e eu continuando no anonimato sem reclamar. Porém ambos certamente vimos a Varig com olhos diferentes e assim foi para também tantos que nela trabalharam, sem, entretanto nenhum de nós poder negar que a Varig foi uma das maiores empresas de aviação comercial do mundo.

Quando comecei a voar, encontrei uma empresa estruturada, bem dirigida e voltada unicamente para o progresso, crescer e vencer, sabiamente controlada por homens e mulheres dignos dos cargos que ocupavam e todos eles com devoção de amor pela empresa acima do compreendido. Meu curso de comissário de bordo foi algo grandioso como uma faculdade, e eu que já tinha carteira de vôo podia comparar a diferença do curso Varig entre todas as demais congêneres. A Varig mantinha méritos e nome no Brasil e no exterior, méritos e nome merecidos porque estava sempre se esforçando para melhorar, sempre voltada a conseguir o título de melhor empresa mundial, na época pertencente a Swissair. Aos seus funcionários ela assistia desde o pagamento em dia do salário justo até a criação de uma fundação, a FRB que levava o nome do fundador Ruben Berta, criada com única intenção de ver assegurada à assistência aos funcionários da empresa, na ativa ou aposentados. Existia o serviço médico, áreas de lazer, descontos conveniados em hotéis, clubes, restaurantes, enfim locais os quais seus funcionários pudessem desfrutar. Nos anais da Cia tudo era limpo, organizado, asseado e funcional, com refeitórios, confortos de salas de espera, locais de trabalho, enfim um primeiro mundo dentro do nosso iludido país. Seus aviões sempre bem cuidados iam se modernizando a cada surgimento e a empresa tinha o melhor serviço de bordo nacional e de atendimento ao passageiro tanto a bordo como nos aeroportos e agências, e em tudo existia aquela preocupação única voltada para o conforto e segurança de quem mantinha viva a empresa. Todos nós e sem exceção, éramos gente sempre instruída ao bom comportamento e capacidade de operação tornando a Varig nos anos setenta de fato uma potência.

Porém não há sol que sempre brilhe e estrela que nunca se apague e a Estrela Brasileira começou a se apagar quando seus diretores, depois da morte de seu fundador e patriarca o senhor Ruben Berta, tomaram nas mãos o futuro da empresa, demorando anos, mas conseguindo então, destruí-la.

Tudo começou quando, ambicionando demais ela começou a deixar de lado a velha teoria de que somente os capazes, os bons, trabalhavam para ela, aceitando mais pela necessidade do que pela capacidade novos empregados e a chegada do primeiro Jumbo, o Douglas DC-10, foi o marco dessa mudança. Depois foram as mudanças internas dentro das diretorias e no serviço de bordo, a opinião de que seria melhor se dirigido se por gente do meio, ou seja, aeronautas foi outro grande erro cometido. E lá se foram os bons dirigentes na troca pelos mal preparados.

Aeronautas eram treinados para voar (e na Varig, espetacularmente treinados), nunca para serviços burocráticos e a queda começou. E nos anais das chefias a coisa também degringolava a cada ano com surgimento de novas direções, seqüências e outros afins, coisa que antes bem dirigida e cuidada funcionava, mas já não produzia mais como antes, coisa que não mais fiscalizada dava chance ao bandido. Lá se foram indo embora os hotéis da Varig, os brilhos e os viços, o charme do serviço de bordo, o teor da anfitrionagem, e finalmente o seu mais precioso bem de existir, seus aviões, agora endividados e obrigados à devolução.

E se pergunta o porque disso tudo? Simplesmente porque quem agora vestia a camisa da Varig não mais a idolatrava, amava ou queria seu progresso absoluto, mas sim apenas gozar de suas vantagens e ambicionar seus bens. Seu verdadeiro e fiel amante, o senhor Ruben Berta estava morto e não havia mais a quem temer.

Surgiram então as divisões Varig e nos céus a estrela brasileira antes única e soberana se fragmentou em várias Varig, todas marcadas para afundar por ambições e divergências.
E o caos se deu com o apagar da estrela e de todas as suas ramificações, algumas frações ainda tentando brilhar, mas logo esmorecendo pelo peso das dívidas acumuladas e a se acumulando até que finalmente o breu se fez e no universo da Varig só restou o nome na saudade.

Triste fim de uma empresa que merecia vida longa, além do que brilhou, triste fim de seus funcionários hoje desprotegidos e entregues a desolação e a angústia, naufragados pelas mãos dos ambiciosos e corruptos, triste final da Estrela Brasileira.

A história desse ocaso daria um novo livro se pesquisada junto a todos que viveram sua glória e derrota, mas isso seria desonesto para quem no momento brilha como ela através de sua história contada como viveu, a minha amiga Cláudia, para quem sinceramente desejo grande futuro como escritora e para quem devo louvores pelo tempo de nossa atuação dentro dos aviões de sua Estrela Brasileira.

Comissário Curvello


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