domingo, 29 de maio de 2011

AOS AMIGOS QUE SE FORAM

Quando Charles de Gaulle disse que “O Brasil não é um país sério”, e Pelé “Brasileiros não sabem votar”, ficamos indignados. Infelizmente, eles estavam certos. Este é o País do faz-de-conta. Fingimos que a miséria está sendo debelada; “Que nunca neste país” tivemos um desenvolvimento extraordinário, que a nossa música é de melhor qualidade e inteligência que a dos outros povos. Que nossas mulheres

são as mais belas, que a pedofilia não é alarmante como dizem. Que o machismo está acabando, pois as mulheres estão tendo uma liberdade igualitária à dos homens, que não temos preconceitos com as minorias, que não temos atitudes discriminatórias com os negros. Mentira! E mentimos tanto que acreditamos que a nossa mentira é a verdade. Faz-de-conta que não pagamos tantos impostos, faz-de-conta que não estamos sendo lesados pelos corruptos, faz-de-conta que a justiça tarda mas não falha. E vamos às mentiras e dissimulações. Dizem: - olhemos para o futuro. Merda! EU NÃO QUERO FAZER- DE- CONTAS! Somos o resultado do nosso passado. E o passado não se esvai da nossa consciência facilmente. Não vira fumaça como fizeram com a Varig. Não existe passar uma borracha e apagar mais da metade de nossa existência. Nunca esquecerei o que fizeram conosco. Podem abrir a caixa do cofre da vergonha e despejar todo o dinheiro que lá existe em cima de mim, porém, não vou fazer-de-conta que neste mês de maio estamos chegando à triste cifra de 571 mortos. Eles fazem a diferença. Faleceram desiludidos com tudo. Quem substituirá o bom humor e caráter do Reinaldo Teixeira? E as peculiaridades dos outros 570? Não seguirei citando nomes, para não me emocionar mais do que estou. E dos vivos que estão pregados à cruz que há na Terra só esperando a piedade do momento supremo de acenderem velas? Desculpem-me os crédulos, “Deus não é brasileiro”.
Ó mês de Maio! Mês dos amigos que se foram. Não pude mostrar-lhes o ninho que as andorinhas fizeram no meu telheiro. Vocês não viram a languidez do corpo e do olhar que trago comigo, do gerânio lilás que desabrochou em minha janela tentando consolar-me. Eles são apenas gerânios e lilases, e isto ainda lembra vocês. Não terei nem a alegria de dizer: - Morreram com dignidade. Não pude contar a vocês as lágrimas que chorei de saudades e de indignação. Ofereço apenas as nossas lembranças e uma “Canção com lágrimas.”
Título e Texto: Ever Botelho*, 29 de maio de 2011

Ever Botelho
Ex-comissário de voo na Varig, escritor e artista plástico

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