quarta-feira, 3 de agosto de 2011

O DIA EM QUE MEU MUNDO ACABOU.

                      

Eu me chamo Carlos e sempre ouvi histórias de que o mundo um dia vai acabar, que em outros períodos que acabou para a maioria dos seres vivos sobre a Terra através de um cataclismo, o do período jurássico citando nas suposições dos cientistas como um grande meteoro havendo se chocado de encontro ao nosso planeta e extinguido a vida sobre ele quase que totalmente. Agora vem os símbolos Astecas mostrando um novo final para o ano de 2012 e até filmes sobre ele já foram feitos imaginados de como será e então o fim do mundo continua sendo temido pela maioria dos habitantes dessa nossa linda Terra que enquanto isso não acontece nos mesmos  a destruímos sem lhe respeitar.
Há também a crença de que o mundo acaba para quem morre, os céticos acreditando tudo terminado ali e os menos céticos acreditando de que existe mesmo outra vida após a passagem e isto em diversas teorias porque até hoje ninguém pode provar e os mortos não falam.
Para ser sincero eu não sei o que aconteceu comigo, estava bem, alegre, distraído, ia para uma festa quando, de repente, o meu mundo acabou e foi tão de repente que não acreditei.  Eu me via ali, deitado naquele asfalto frio, imóvel, meio desengonçado na posição, vendo carros passarem espremidos em um corredor de gente e um policial tentando organizar. Eu estava ali sozinho, sem sentir medo, dor ou qualquer coisa, apenas caído, mas estranhamente escutando, vendo e sentindo como nunca antes havia podido usar estes sentidos em toda a vida.
Ao meu redor pessoas choravam, outras olhavam, outras até sorriam e eu sabendo de tudo que pensavam, ouvindo tudo que falavam por mais sussurrante que a voz fosse, sentindo tudo que sentiam como se deles todos eu fizesse parte. E havia um bêbado pregando a cachaça, dizendo que se beber se morre e se não beber também e ele era simplesmente gozado. Ao lado dele uma mulher reclamava daquilo que acusava ser desrespeito, pedia providências ao guarda que parecia ocupado demais para prestar atenção em mim. Mais adiante não sei de onde alguém zombava de minha posição achando patética, mas havia uma expressão de dor em seu olhar fingido, talvez para impressionar alguém mais lhe olhando. Ah, quanta falsidade.
 Em outro lado alguém chorava alto, parecia histerica, falando meu nome sem parar e comicamente me perguntando porque eu havia me ido. Mas ido para onde, como se eu estava ali ao alcance dos olhos e de um toque? Então vi chegar um comerciante meu conhecido que levantou um plástico negro que cobria meu corpo sem me cobrir, fez um sinal da cruz e me olhou, e como por milagre pude ler seu pensamento que pensava: --- Filho da puta, morreu me devendo, o safado.
Eu parecia entender a todos e a tudo, vendo e compreendendo toda aquela situação, mas nem tanto porque tudo ali me era simplificado e inútil.
Do lado de fora do grupo eu ouvia pessoas conversando e as frases me chegavam desconexas.:

--- Coitado, tão novo.

--- Novo e bonito, mas descuidado não é?

--- Será que tem parentes, filhos, mulher?

-- O que importa agora tudo isso? Ele partiu, não tem mais ninguém e não é de mais ninguém.

E ouvindo isso alguém de perto, pensava alto, ou assim eu e escutava:

--- De mais ninguém mesmo, mas dos vermes que vão fazer um banquete quando for enterrado.

E eu ali deitado sem poder compreender nada, ou tentando compreender tudo e não conseguindo realmente. E os comentários avulsos prosseguiam vindo de todos os lados.

--- Bem feito, quem mandou não olhar onde andava?

--- Coitado... Será que doeu, que ele sentiu?

--- Ah, antes ele do que eu.

--- Meu deus, olha só como está deitado?  Nós somos mesmo frágeis.

--- Será que tem dinheiro naquela carteira ali no bolso? se tiver o policial vai pegar, aposto.

--- Porra meu. Estivesse só eu e ele aqui agora e eu faria a limpa. Carteira gorda, anéis, aliança grossa de ouro. Até aquele casaco ali vale uma nota.

--- Nossa, ninguém acendeu uma vela, coitado.

-- Será que o rabecão vai demorar?  O trânsito está uma droga.

--- Puta que pariu esse cara... Morrer logo ai atrapalhando o trânsito. Vou chegar atrasado em casa, porra.

--- Será que já avisaram a família dele?

--- Hei seu guarda, tira o corpo de lá, encosta no meio fio pra gente poder rodar.

--- O sacana parecia rico, bem feito então, empacotou igual a qualquer um.

---- É gente daqui ou é de longe?

E assim ia, tudo se repetindo, embaralhando, misturando na babel de vozes e eu ali, parado, desengonçado, esperando não sei mais o que. E era curioso como eram diferentes os comentários, todos me acusando de algo ou com pena de algo e não sei quem estava certo porque difícil era identificar, reconhecer.
Finalmente a multidão abriu e chegaram uns homens vestidos de bege, me pegaram sem a menor parcimônia e jogaram dentro de uma caixa de metal, depois embarcaram a caixa em um carro que saiu rodando., E ali também, sem eu ver quem falava porque era somente eu e o escuro, continuavam os comentários.

--- Porra meu, mais um hoje e peço demissão. O que estes caras tem que fazer sendo descuidado e dando trabalho pra gente, merda.

-- Vão abrir o sacana todo daqui a pouco e depois costurar vazio do bucho. Com este já é o sexto que eu levei para a morgue.

--- Êta carro para feder a defunto. será que não colou a reclamação de embarcarem mais formol.

--- Que formol, meu chapa? Formol tá caro, eu jogava era mesmo creolina.

--- Quanto será que vai valer esse daí se não aparecer dono pra reclamar? Pelo jeito é sadio, vão fazer uma nota com os órgãos dele.

E eu ali, agora ajeitado dentro de uma caixa de metal fria, fria como eu, insensível como eu, muda como eu porque caixas não falam e defuntos também não. Foi somente então que ao avaliar isso me dei conta que aquele era o dia em que meu mundo acabou, sem o mundo haver se acabado.
 Acho que se pudesse então eu sorria, abriria um largo sorriso porque antes de ir para o não sei onde, eu descobri de como o mundo que tanto amei e que tanto temi se acabar, era hipócrita.

Por Jorge Curvello




















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