sábado, 11 de junho de 2011

RETORNO AO BAR DO NADA

RETORNO AO BAR DO NADA


Parece sina, mas é necessidade e, sem ter para onde ir neste fim de mundo voltei hoje ao bar do nada. Voltei pra encontrar mais um ambiente bizarro e cheio de gente que nada tinha a ver comigo como vou contar.
Cheguei, pedi minha notória coca cola de seiscentos ml, um maço de cigarros e fósforos, coloquei ao lado sobre uma mesa minha garrafinha com Rum e, degustando biscoitinhos da Piraquê sabor quijinho comecei a olhar o movimento ouvindo musica barata saída do junk Box. Logo um berro foi ouvido e sem voltar à cabeça eu sabia partir de um velho bêbado bebendo no outro balcão, um sujeito bizarro usando uma peruca meio chanel pra esconder a careca. E ele não cansava de berrar par outros passantes

--- ESCUUUTAAA, Não me viu? Vai seu jagunço de chuteira.


Jagunço de chuteira... E fiquei imaginando como seria um jagunço jogando futebol. E ele não ficou naquela, berrava e berrava, atrapalhando a música.
Depois foi o homem sentado na mesa a minha frente, puxando assunto para logo depois cortar, um matuto trabalhando em algum lugar no bairro e aprisionado, como eu, no lugar do nada. E logo chega um vizinho envergando camisa do Vasco, eufórico um dia depois ou dois, não sei, do time ser campeão. E ele me vê e diz.

---- Aí seu Jorge, é hora de suar a camisa.

E suar a camisa significava o que se eu sentia frio usando uma normal, encapotado com uma jaqueta?

No junk Box a música paga continuava entoando e eu tentando, sem poder, me divertir com ela entre um gole da bebida, meus acompanhantes biscoitos da Piraquê e cigarros.
E em outra mesa mais afastada duas coroas gordas, comiam torresmos com palito, as duas entornando cervejas que já somavam duas garrafas vazias. Amigas se distraindo, pensei... Mas seriam?
Eis que da rua surge Robson, o pé de cana que basta se entrar em um botequim do lugar e aparece, sempre cambaleando e a procura de quem lhe pague uma cachaça. Eu até procurei dar uma de presente, mesmo sabendo colaborar com sua propensa cirrose, mas custava caro, um real, e achei muito por um veneno e desisti.
No junk Box entra um grupo de pagode e o cantor canta Fugidinha com você. Ah se eu tivesse alguém porá fugir comigo daquele lugar? E na calçado um dos diversos cães, vadios, de mau humor se atraca com outro provocando espanto da freguesia que começa a opinar falando abobrinhas. Ah quanta cultura meu Deus!

Chega um casal acompanhado de um garoto e um rapazola e o rapazola, pinta de garoto normal sai do armário ao receber sua bebida, num uuiiii que assusta de tão fresco. Não tem nada não, tudo vale neste lugar do nada.
Alguém fala alto e escuto notícia que à noite o bar da frente vai ferver de gente e alguém ao lado complementa. Eu sei... Mas tomara que a porrada não coma como em todos os sábados. E eu, sem me atrever a olhar os donos das vozes penso comigo... É só pagar pra ver.
Meu relógio me mostra que já são quatorze horas e acho que é hora de voltar para casa. Afinal saí só pra comprar algo no mercadinho do lugar. Olho mais uma vez ao redor e nada acontece ou tudo acontece e eu não vejo, não entendo o que fazia ali, sozinho, sem ter com quem conversar com medo de ofender por não acompanhar a cultura local, pensando de como estaria melhor comprando e indo embora, ficando em casa e mesmo que só para ficar sentado na frente de um computador. Bolas, mas eu ainda estou vivo, não tenho culpa se confiei em uma entidade pagando por aposentadoria especial e ela me enganou, não tenho culpa se Deus me reservou este destino mesmo quando paguei caro para ter uma velhice melhor, não tenho culpa de me esquecer de ser igual, camaleônico, poder ser, sentir e viver como os que agora me cercam, viver a vida que esqueci que existia quando um dia fui comissário de bordo, homem culto e refinado, da também fracassada Varig.
E retorno para casa depois de pagar a conta, sozinho, mas consolado de saber que entre os quase dezesseis mil fracassados do Aérus, nem todos precisam freqüentar o bar do Nada.

Por Jorge Curvello

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